A vocação e a missão são realidades existenciais imbricadas de tal forma que é praticamente impossível falar de uma sem se referir à outra. A vocação é uma relação dinâmica que têm como interlocutores Deus e o ser humano. O dom da vocação é como uma semente que pode germinar no terreno da vida, abrindo-se para Deus e para as outras pessoas, a fim de partilhar o tesouro encontrado. Por isso, a vocação inclui o “envio”. Neste sentido, por ocasião do Dia Mundial das Vocações 2023, o Papa Francisco escreveu: “não há vocação sem missão”.
É maravilhoso descobrir que somos chamados por Jesus Cristo. Esta chamada é graça, é um dom gratuito, que vai provocando respostas. Não é uma chamada estática, mas dinâmica pois nos alcança, por obra do Espírito Santo, de uma maneira sempre nova, iluminando nossa inteligência, infundindo vigor na vontade, fazendo arder o coração.
No entanto, o ardor do peito pode diminuir e os pés podem até abandonar o caminho. Por isso, é preciso cuidar com amor da “plantinha da vocação”. É importante, destarte, o próprio cultivo espiritual tendo a Palavra de Deus como uma fonte copiosa de espiritualidade que fortifica e aquece o coração. Neste sentido, é paradigmática a perícope sobre os discípulos de Emaús.
Depois da morte de Jesus, eles haviam desistido na vocação. Sentiam-se derrotados pois antes apostaram suas vidas no Projeto anunciado por aquele homem que eles “achavam” ser o Messias: o ungido pelo Espírito Santo, para anunciar a Boa Notícia aos pobres, a libertação aos presos, aos cegos a recuperação da vista, a libertação dos oprimidos, o ano da graça do Senhor. A vocação e o projeto espiritual de Jesus de Nazaré havia sido a grande luz da vocação dos discípulos de Emaús. No entanto, a derrota do Mestre crucificado, desmoronou com a vocação: os corações não ardiam, os pés haviam desistido da esperança e do futuro do Reino Deus. A luz apagara-se!
Entretanto, tiveram a graça de serem cuidados por Aquele viandante que deles se aproximou, ouviu o desabafo e a dor da crise vocacional e, que começou a falar de “Jesus” a partir de Moisés e dos Profetas, modificando os corações desanimados e desiludidos. A Palavra libertadora e profética ajudou-os a interpretar a realidade de modo novo. Em seguida, a partir da experiência do “Pão Partilhado”, colocaram os pés a caminho para anunciar que “o Senhor Ressuscitou!”
Também hoje Jesus Ressuscitado caminha com seus discípulos missionários, sobretudo quando se sentem desanimados e frustrados perante as iniquidades que nos rodeiam e tentam nos sufocar: insensibilidade perante a dor, enorme desigualdade social, descuido ambiental, alienação e falta de consciência social, individualismo, idolatria do Mercado, mundanismo espiritual, clericalismo. Ele caminha e quer fazer nosso coração arder e nossos pés se colocarem a caminho para evangelizar até os confins do mundo. E assim, “marcados a fogo por esta missão de iluminar, abençoar, vivificar, levantar, curar, libertar” (EG 273) testemunhamos, por palavras e obras, que Ele Ressuscitou!
Jesus Cristo nos chama a um estilo de vida alegre, acolhedor, comunitário, sinodal, capaz de proximidade, compaixão e ternura em contracorrente à cultura do descarte e da indiferença. Ele nos envia, porém “alguns resistem a provar até ao fundo o gosto da missão e acabam mergulhados numa acédia paralisadora” (EG 81) e missão é – dizia o Servo de Deus, Dom Helder Camara – “mover-se e ajudar muitas outras pessoas a moverem-se no sentido de tudo fazer por um mundo mais justo e mais humano”. “Não deixemos que nos roubem a força missionária!” (EG 109).
Autor
Pe. Ivanir Antonio Rampon
Presbítero da Arquidiocese de Passo Fundo. Diretor e professor na Itepa Faculdades. Doutor em Teologia Espiritual pela Pontifícia Universidade Gregoriana, Roma, Itália.
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