A canção popular “Maria de Nazaré” lança uma questão importante sobre a vocação de Maria: “Menina que Deus amou e escolheu pra mãe de Jesus, o filho de Deus, Maria que o povo inteiro elegeu, Senhora e Mãe do céu”. Nesta canção, Maria é reconhecida como a escolhida, a querida de Deus e do povo. A grandiosidade de Deus é manifestada nesta jovem que gera o Salvador da humanidade, mas também na sua missão de discípula de seu Filho e irmã do povo. Podemos imaginar o que teria se passado pela cabeça de Maria, as perguntas que surgiram em sua mente. Uma moça, virgem (parthénos), ao mesmo tempo desposada (emnesteuméne) com José, “da casa de Davi” (Lc 1,27). Ela descobre que terá um filho sem nunca antes ter se submetido às condições naturais para isso. Impossibilidade? Não para Deus (Cf. Lc 1,37).
O processo da caminhada do discípulo (a) e do vocacionado (a) parte de buscas, questionamentos, incertezas, mas também de experiências que vão confirmando a presença de Deus e do seu amor que conduz o ser humano à realização e vida plena. O amor de Deus por nós é infinito, e de certa forma, Ele “sai” de si e vem ao encontro da pessoa humana; Ele se revela a fim de nos fazer participantes de sua vida divina, conferindo-nos, assim, a nossa primordial vocação (cf. Documento de Aparecida, n. 129).
Falando de Maria, a Escritura ressalta constantemente elementos fundamentais de sua vocação e discipulado. Marcos apresenta um retrato de Maria como a convidada a fazer parte do discipulado tornando-se uma “peregrina da fé”. Mateus a destaca como a a Mãe virginal do Messias e, este fato maravilhoso somente pode ser entendido como a obra do Espírito Santo. Lucas a apresenta como mulher da escuta, ativa, comprometida, a mulher missionária que abre caminho em meio às dificuldades. Em João, a presença de Maria, a Mãe de Jesus e Mãe da Igreja, é inspiradora de vida missionária, que ensina a contemplação, a escuta da Palavra de Deus e a presença atenta às necessidades do povo.
O fato de Maria, menina pobre de Nazaré, conceber Jesus Messias, o Filho de Deus, indica que o Deus da vida a chama para algo maior e inverte a ordem social: os pobres e oprimidos se tornam sujeitos da história com o projeto de solidariedade e fraternidade. O texto do Magnificat (Lc 1,46-55) apresenta a teologia confessada pela jovem de Nazaré: a proclamação da fé vivida, que consiste na vivência do autêntico discipulado. Proclamar a fé consiste em anunciar o Deus em quem se crê e sob cuja orientação se caminha. Trata-se de um Deus ternura que lança seu olhar sobre uma humilde mulher das montanhas da Galileia, habitante de uma cidade desconhecida e mal afamada. O Deus de infinita majestade se dá ao trabalho de se debruçar sobre um ser humano extremamente humilde (tapeinós), uma vida destituída de qualquer importância social, como a da imensa maioria do povo humilde e pobre.
Maria nos ensina a sermos discípulas e discípulos do Senhor na fé ativa, atenta e amorosa, na doação e no serviço. Ela nos mostra como ficar de pé sob a cruz, acreditando na ressurreição do dia a dia, cumprindo nossa missão na liberdade do coração, para que Jesus seja louvado em cada instante da vida. Como nos afirma Papa Francisco na Exortação Evangelli Gaudium: “Maria é como uma verdadeira mãe. Maria caminha conosco, luta conosco e aproxima-nos incessantemente do amor de Deus” (EG n. 225). Como vocacionada e discípula de Deus, alimenta em nós a esperança de que vale a pena sonhar e criar alternativas em vista de uma nova sociedade, comprometidos com a causa do Reino.
Autora
Ir. Maria Luísa de Lucca
Professora na Itepa Faculdades. Mestre e doutoranda em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS.
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