No último sábado, dia 3 de outubro de 2020, o Papa Francisco assinou sua nova encíclica, intitulada “Fratelli tutti”. A assinatura foi em Assis, na Itália, ao final de uma celebração na cripta da Basílica inferior, junto do túmulo de São Francisco. A celebração foi aberta a um número restrito de participantes, tendo em vista os cuidados devido à pandemia da Covid-19.

Em sua encíclica, o Papa fala sobre a importância da fraternidade e da amizade social. Sendo dividida em oito capítulos, o texto traz problemas recorrentes de nosso tempo, mostrando que se vive “as sombras de um mundo fechado”. No início, o Papa reflete sobre o esvaziamento ou a manipulação de algumas palavras consideradas importantes para a caminhada do cristão. Segundo ele: “que significado têm hoje palavras como democracia, liberdade, justiça, unidade? Foram manipuladas e desfiguradas para utilizá-las como instrumento de domínio, como títulos vazios de conteúdo que podem servir para justificar qualquer ação” (14).

No segundo capítulo traz presente a parábola do bom samaritano. “A narração é simples e linear, mas contém toda a dinâmica da luta interior que se verifica na elaboração da nossa identidade, que se verifica em toda a existência projetada na realização da fraternidade humana. Enquanto caminhamos, inevitavelmente embatemos no homem ferido. Hoje, há cada vez mais feridos. A inclusão ou exclusão da pessoa que sofre na margem da estrada define todos os projetos econômicos, políticos, sociais e religiosos” (69). Assim, destaca que o amor é o caminho que nos leva ao encontro dos irmãos excluídos da sociedade.

Intitulado “pensar e gerar um mundo aberto”, o terceiro capítulo ressalta a solidariedade e diz-nos que ela “é pensar e agir em termos de comunidade, de prioridade da vida de todos sobre a apropriação dos bens por parte de alguns. É também lutar contra as causas estruturais da pobreza, a desigualdade, a falta de trabalho, a terra e a casa, a negação dos direitos sociais e laborais” (116), nos provocando a sairmos de nós e irmos ao encontro dos outros.

No quarto capítulo, “um coração aberto ao mundo inteiro”, o Papa traça uma perspectiva de acolhimento e respeito às pessoas vindas de outros povos e nações, destacando que podemos aprender com elas e que isso “transforma-se num dom, porque ‘as histórias dos migrantes são histórias também de encontro entre pessoas e entre culturas: para as comunidades e as sociedades de chegada são uma oportunidade de enriquecimento e desenvolvimento humano integral para todos’” (133).

Na parte dedicada a uma “política melhor”, Francisco destaca a importância do trabalho na sociedade e nos diz que “é indispensável uma política econômica ativa, visando promover uma economia que favoreça a diversificação produtiva e a criatividade empresarial, para ser possível aumentar os postos de trabalho em vez de os reduzir” (168). E insiste que “precisamos duma política que pense com visão ampla e leve por diante uma reformulação integral, abrangendo num diálogo interdisciplinar os vários aspetos da crise” (177).

No sexto capítulo, sobre “diálogo e amizade social”, emerge o conceito da amabilidade, onde o Papa nos diz que: “o exercício da amabilidade não é um detalhe insignificante nem uma atitude superficial ou burguesa” (224). E nos lembra que, por vivermos uma vida corrida, levada pelas ansiedades de século, perdemos em não dedicarmos tempo “para dizer ‘com licença’, ‘desculpe’, ‘obrigado’” (224). São atitudes pequenas, mas que fazem a diferença.

“Percursos dum novo encontro”, sétimo capítulo da encíclica, recorda-nos o princípio da paz, da reconciliação e do diálogo, sublinhando que “quando os conflitos não se resolvem, mas se escondem ou são enterrados no passado, há silêncios que podem significar tornar-se cúmplice de graves erros e pecados. A verdadeira reconciliação não escapa do conflito, mas alcança-se dentro do conflito, superando-o através do diálogo e de negociações transparentes, sinceras e pacientes” (244). E seguindo, faz uma crítica à guerra, já que essa destrói vidas, direitos e a casa comum, sendo ela “um fracasso da política e da humanidade, uma rendição vergonhosa, uma derrota perante as forças do mal” (261) e indica que o dinheiro usado em armamentos pode se converter em “um Fundo mundial, para acabar de vez com a fome” (262). Por conseguinte, trata da pena de morte com repúdio e indignação, dizendo que deveria ser extinta do mundo.

E, por fim, no último capítulo, que trata sobre “as religiões ao serviço da fraternidade no mundo”, o Papa destaca um direito presente na Declaração Universal dos Direitos Humanos, que é a liberdade religiosa, argumentando que isso promoveria a paz e o diálogo. Aponta, ainda o papel da igreja que “pode, a partir da sua experiência de graça e pecado, compreender a beleza do convite ao amor universal” (278), e ressalta que é errado aquele conceito de que igreja não deve se importar com os bens e direitos humanos e sim se preocupar somente com as coisas divinas. Pelo contrário, “tudo o que é humano nos diz respeito (…); onde quer que as assembleias dos povos se reúnam para determinar os direitos e os deveres do homem, sentimo-nos honrados, quando no-lo permitem, tomando lugar nelas” (278).

Ao final de sua encíclica, o Papa Francisco faz referência ao Beato Charles de Foucauld, apontando que é preciso identificar-se com os últimos, com os pequenos de nosso tempo, para ser “o irmão universal” (287), aquele amigo de todos. Concluindo, faz a Oração ao Criador e a Oração cristã ecumênica.

Fratelli tutti” é a terceira encíclica do pontificado do Papa Francisco, precedida por Laudato Si’ (2015), sobre o cuidado da casa comum, e Lumen Fidei (2013), sobre a fé. Leia aqui na íntegra o texto da nova encíclica.

Texto: Douglas Francisco Almeida dos Santos/Pascom Diocese de Vacaria.
Imagem: Di Alfredo Borba – Opera propria, CC BY-SA 4.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=34671623

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